A quem interessa a reestruturação da VALE?Escrito por Rogerio Lessa e publicado originalmente no site da AEPET - Associação dos Engenheiros da Petrobrás Proposta aumenta significativamente a participação estrangeira no capital da VALE
Os diretores da FUNCEF e os conselheiros da Petros que foram eleitos pelos funcionários estão propondo ação popular para evitar o processo de reestruturação da Vale, que implica na transferência do controle acionário para um conjunto de acionistas, em detrimento do bloco formado pela Valepar, em que os fundos de pensão estatais são parte importante. Os representantes eleitos assinaram manifesto (leia a seguir) no qual reiteram seu apreço pela melhor governança, que deve, no entanto, implicar também em um processo seguro de tomada de decisões, sem viés ideológico. Max Pantoja, diretor eleito da FUNCEF e signatário do manifesto, avalia que o processo implica em perdas para os investidores que ele representa. Na opinião do diretor da FUNCEF, ao apoiar a transferência do controle da Vale para um bloco de acionistas, em detrimento da Valepar, ele estaria ferindo a Lei das S/A nos quesitos zelo, diligência e lealdade, entre outros aspectos. Pantoje criticou sobretudo a forma intempestiva para a tomada de uma decisão tão importante. "Nossa iniciativa teve como origem a forma como o projeto repentinamente chegou para nós decidirmos, com um prazo pouco superior a um dia. Preventivamente, dissemos que não vamos tomar uma decisão dessa envergadura de um dia para o outro, com um volume de informações raso e insuficiente". Para o representante eleito pelos participantes da FUNCEF, é necessário um parecer técnico prévio para ancorar a decisão. "O argumento dos defensores do processo é que uma suposta melhoraria na governança elevaria o valor das ações das empresas, o que nos beneficiaria. Não concordamos. A reestruturação, na nossa compreensão, é lesiva aos interesses das fundações. "É um sofisma dizer que transferir a participação acionária daria mais liberdade aos donos das ações. Na realidade, a proposta transfere cerca de 25% da companhia para o capital estrangeiro". Já Silvio Sinedino, conselheiro eleito da Petros, considera “absurda” a premissa de que uma empresa será mal geria apenas pelo fato de ser estatal. Ele chama a atenção para os meandros desse tipo de processo. “Na privatização da Vale, o Bradesco foi o avaliador e depois se tornou comprador. Devido a fatos como este, até hoje existem ações contra a privatização da Vale, infelizmente ainda não julgadas”, afirma Sinedino, que é expresidente da AEPET, ponderando que nessas ocasiões geralmente o chamado “mercado” reivindica urgência para forçar a venda das empresas.
Leia a seguir o manifesto dos representantes eleitos da FUNCEF e da PETROS."Nós, representantes eleitos da FUNCEF e PETROS, temos acompanhado com bastante desconforto, apreensão e inconformismo o processo de reestruturação da VALE, onde a etapa de adesão voluntária foi encerrada na última sexta feira, 11 de Agosto, na qual foi atingido o percentual de 84,4%. Juntas, FUNCEF e PETROS possuem cerca de 20,5% da LITEL (a PREVI possui cerca de 78,5% e FUNCESP cerca de 1%), e sendo que a LITEL possui 49% da VALEPAR, e por fim a VALEPAR possui cerca de 44% das ações ordinárias da empresa, os dois fundos de pensão possuem, de forma indireta, uma proporção conjunta de 4,42% da VALE. Como essa proporção de participação, que nos qualifica como minoritários, todo e qualquer avanço de governança que seja proporcionado à empresa nos interessa e terá o nosso apoio. Entretanto, a promessa de uma melhor governança, que a eventual migração para o Novo Mercado representaria, e que realmente traga maior arcabouço protetivo aos acionistas minoritários, não pode ser colocada como um objetivo a ser alcançado a qualquer preço, como o teor da proposta de reestruturação, ora em curso, traz como impacto aos atuais detentores do controle da empresa, agrupados na holding VALEPAR. Além dos aspectos econômicos, há também aspectos formais que sinalizam em que condições a tomada de decisão acerca da reestruturação foi adotada. Assim, vamos recapitular esses aspectos: 1 - O anúncio da operação de reestruturação foi feito ao mercado no dia 20 FEV, simultaneamente ao vencimento do seu acordo de acionistas vigente. Apesar das insistentes cobranças no âmbito de sua governança, acerca da estratégia a ser definida previamente para debater e encaminhar as alternativas de cenário a serem debatidas/definidas, somente na semana que antecedeu o anúncio é que foi dado conhecimento, a nós representantes eleitos, sobre seu teor, elaborado e apresentado/defendido pelo banco de investimento Morgan Stanley. 2 - Em síntese, a operação previa a extinção do bloco de controle, constituído por meio da holding VALEPAR, sendo compensada por um bônus de 10%, em ações ordinárias, para os atuais controladores. Os demais detentores de ações ordinárias não receberiam qualquer vantagem. Os detentores de ações preferenciais, igualmente alvo da operação, receberam a oferta, em caráter de adesão voluntária, de conversão de ações PN para ações ON, a partir de uma relação de troca na proporção de 93 ações ON para cada 100 ações PN, ou seja, deságio de 6%. 3 - Essa proposta tinha por intenção, se bem sucedida, preparar o terreno para a migração formal da VALE para o chamado “Novo Mercado”, ou seja, todo o capital social convertido em ações ON, e, adicionalmente, a modelagem da empresa no formato corporation, que são as empresas conceituadas como “sem controle definido”. 3.1 - Nesse modelo de corporation, o exercício do controle é realizado pelos acionistas com maior proporção de participação, no âmbito do Conselho de Administração, que obtém assentos na proporção acionária detida, e limitada ao máximo de 25% de ações ON. O acionista que, porventura, pretenda obter proporção acima de 25%, deverá estender a oferta de aquisição aos demais acionistas (cláusula chamada poison pill). Ou seja, é uma configuração sujeita a oscilações/mudanças sem as restrições/amarras que o modelo “bloco de controle” oferece, que é o atualmente vigente e do qual a FUNCEF e a PETROS participam, ainda que de forma minoritária. 4 - No dia 11 de Maio de 2017, ocorreram as seguintes manifestações, de forma praticamente simultânea e concomitante, com potencial caráter pro-forma e com riscos decisórios significativos, dada a exiguidade dos prazos envolvidos: 4.1 - Ofício VALEPAR para VALE, comunicando o teor da proposta de reestruturação e solicitando sua apreciação; 4.2 - Reunião da Diretoria Executiva da VALE, apreciando e aprovando a proposta de reestruturação; 4.3 - Reunião do Conselho Fiscal da VALE, emitindo parecer sem quaisquer considerações sobre a proposta; 4.4 - Reunião do Conselho de Administração da VALE, apreciando a aprovando a proposta de reestruturação. 4.5 - Para balizar a proposta de reestruturação, e por exigência legal (lei das S/A) foram contratados dois laudos de avaliação de VALEPAR, emitidos pela PWC (Price Waterhouse Coopers) e KPMG. Ambos os laudos foram emitidos com data de 09 de Maio de 2017, dois dias antes da comunicação formal da VALEPAR sobre a proposta e apreciação pelos órgãos estatutários da VALE. 5 - No dia 12 de Maio de 2017, houve a divulgação do Edital de Convocação da Assembleia Geral Extraordinária (AGE) da VALE, marcada para o dia 27 de Junho de 2017, 45 dias após, prevendo a deliberação de extensa pauta de matérias, incluindo alterações estatutárias, visando a efetivação da operação, a qual seria considerada aprovada caso ocorresse a adesão dos acionistas preferencialistas em percentual mínimo de 54% das ações. 5.1 - No mesmo dia 12 de Maio de 2017, foi disponibilizado, na página ‘Relação com Investidores” do site da VALE, amplo material de consulta aos participantes da AGE, dentre os quais consta o documento “Manual para Participação na Assembleia Geral Extraordinária da VALE S/A”, com 426 páginas, no qual figuram os documentos relacionados no subitem 4. 5.2 - Na página 97 do referido “Manual”, que corresponde à página 40 do laudo de avaliação da PWC, emitido em 09 de Maio de 2017, consta a seguinte informação:
“Premissas de avaliação da VALEPAR
Outro ativo relevante se refere aos ágios gerados na aquisição de participações na Vale, cujo valor contábil é de R$ 3.073 milhões. O valor original desses ágios é de R$ 4.783 milhões, tendo sofrido o efeito de amortizações no passado. Para fins de avaliação da Valepar, o valor dos ágios foi considerado como sendo zero (conforme Instrução CVM 319).” 5.2.1 - A citada Instrução CVM 319 orienta o tratamento contábil a ser dado ao ágio nas operações equivalentes ao da reestruturação da empresa, e o laudo da PWC não esclarece a razão pela qual foi considerado “valor nulo” pelo documento. 5.2.2 - Apesar da evidente natureza econômica do valor, bem como de sua relevância material (R$3,073 bilhões), reafirmada pelo teor da IN CVM 319, e que hoje é de “propriedade” da VALEPAR, o tratamento “neutro” sobre o tema no âmbito do laudo possibilita a criação de um potencial efeito “bonificador” aos demais acionistas, tanto preferencialistas quanto ordinaristas não controladores. 6 - No dia 27 de junho de 2017, mesmo dia de realização da AGE, foi publicada na edição do Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro a Ata da Assembleia Geral Ordinária dos acionistas da VALEPAR, ocorrida no dia 28 de de abril de 2017, e que apreciou e aprovou as Demonstrações Contábeis do exercício de 2016 da VALEPAR, bem como a destinação dos resultados do exercício. 6.1 - Em 2016, a VALEPAR apurou lucro de R$4,492 bilhões. Deste montante, restou aprovada a seguinte destinação: R$225 milhões foram destinados a Reserva Legal, R$289 milhões foram distribuídos aos acionistas de VALEPAR, a título de Juros sobre Capital Próprio. Os saldos remanescentes, no montante de R$3,979 bilhões, foram mantidos na empresa como Reserva de Lucros a Realizar. Novamente, não foram identificados esclarecimentos acerca da decisão pela retenção dos lucros de VALEPAR em 2016, sem a sua distribuição aos acionistas (dentre os quais, LITEL), tendo em vista a iminente operação de incorporação de VALEPAR pela VALE. 7 - FUNCEF e PETROS adotam em sua contabilidade a precificação do valor de VALE por meio de fluxo de caixa descontado, sobre o qual incide percentual de 20%, a título de prêmio de controle. A proposta exigirá de ambas entidades um ajuste de precificação, tendo em vista que a operação oferece uma compensação de 10% aos controladores. 7.1 - Com isso, tanto FUNCEF quanto PETROS terão, na “largada” uma perda de 10% sobre o valor contabilizado em DEZ 2016. No caso da FUNCEF, esse valor equivale a R$500 milhões, e no caso da PETROS, a cerca de R$300 milhões, em números aproximados. 8 - Outro aspecto relevante é que, por diversas ocasiões, executivos da VALE e da própria Morgan Stanley salientaram que a operação traz uma “vantagem” adicional: a de eliminar o risco de “governo” sobre a condução de suas operações. 8.1 - Entretanto, cabe salientar que os fundos de pensão, abrigados na holding LITEL, majoritária dentro da holding VALEPAR, administram recursos de centenas de milhares de famílias de empregados das estatais que os patrocinam (no caso, Banco do Brasil, Petrobrás e CAIXA), e é com esse fim que devem ser geridos, sem quaisquer influências decisórias governamentais. 8.2 - É para isso que a legislação estabelece todo um conjunto de normas e diretrizes, bem como prevê a participação decisória e a fiscalização dos seus participantes, por meio de representantes legitimamente eleitos. 9 - Considerando todo esse conjunto de evidências, decidimos pela propositura de Ação Popular, no âmbito da Justiça Federal, com o propósito de defender os interesses dos participantes dos fundos de pensão FUNCEF e PETROS, que consideramos prejudicados pelas razões acima expostas, e na busca das devidas reparações econômico-financeiras decorrentes, em favor do patrimônio das entidades, e em decorrência, de seus participantes. 10 - Tal ação foi protocolada no último dia 10 de Agosto de 2017, sob o número 1009492-23.2017.4.01.3400, sendo distribuída para a 22a. vara da Justiça Federal, em Brasília, e nos dará oportunidade de apresentarmos esses e outros argumentos e evidências acerca das implicações da reestruturação da VALE para o patrimônio de nossas entidades. Reiteramos nosso apreço pela melhor governança, mas sempre contra qualquer medida que resulte em perda de oportunidade de geração de valor para um investimento tão relevante para nossas entidades, e para tanto, atuaremos sempre com o ativismo e a diligência necessários para salvaguardar um valor ainda maior: o futuro de nossos participantes." Brasília, 15 de Agosto de 2017. Augusto Miranda FUNCEF Délvio Brito FUNCEF Max Pantoja FUNCEF Ronaldo Tedesco PETROS Sílvio Sinedino PETROS
Acesse nosso site: www.apape.org.br |